Seca e cheias

  • Nos últimos 10 anos verificaram-se longos períodos de seca meteorológica na região Sul de Portugal, em especial no Baixo Alentejo e Algarve.
  • Em 2024, as regiões do Baixo Alentejo e Algarve estiveram 10, dos 12 meses do ano, nas classes de seca meteorológica do índice PDSI, e no período entre julho e setembro muitos locais encontravam-se na classe de seca severa.
  • De acordo com o índice SPI (na escala SPI 6 meses), no final do ano hidrológico 2023/2024 as bacias hidrográficas a Sul do Tejo encontravam-se nas classes de seca meteorológica, com destaque para as bacias do Guadiana e Ribeiras do Algarve em seca extrema.
  • As bacias do Lima, do Cávado, do Ave, do Douro, do Vouga, do Mondego, do Sado e do Guadiana encontravam-se em situação de normalidade.
  • No respeitante às águas subterrâneas, os períodos de precipitação que ocorreram nos meses de outubro a dezembro de 2023 permitiram a recuperação de algumas massas de água, no Norte e Centro do país, observando-se uma melhoria nas massas de água em situação de vigilância. Contudo, persistiu o mesmo número de massas de água em situação crítica, devido às utilizações existentes e à diminuta precipitação, não permitindo uma recarga eficaz, mantendo-se os níveis baixos, nomeadamente, a Sul do rio Tejo.
  • Em Portugal continental estão identificadas 63 Áreas de Risco Potencial Significativo de Inundações (ARPSI), 46 das quais são de origem fluvial/pluvial e 17 de origem costeira.
  • No ano hidrológico 2023/2024 foram registados 154 eventos de cheias, sendo 45% de origem costeira, 38% de origem fluvial/pluvial e 17% exclusivamente pluvial.
  • Registaram-se, em 2024, quatro situações de precipitação intensa que provocaram inundações em alguns locais do território (Noroeste, Alentejo e Algarve).
Descrição: 

A ficha temática “Seca e cheias” avalia a ocorrência de:

  1. eventuais períodos de redução da disponibilidade de água, considerando diferentes definições de seca: meteorológica, agrícola, agrometeorológica e hidrológica; e
  2. períodos de excesso de água, as cheias, as quais podem ser naturais ou causadas por ações humanas, e são caracterizadas pela sua variabilidade em termos de magnitude e frequência. São considerados, ainda, os seus impactos na população, no ambiente, no património e nas atividades económicas.

A precipitação é um dos principais fatores meteorológicos que influenciam diretamente a ocorrência de secas ou cheias. Se chove abaixo do normal durante um longo período, ocorre a seca; se chove intensamente num curto espaço de tempo, podem ocorrer cheias ou inundações.

A duração de uma precipitação anormalmente reduzida, bem como a amplitude dos seus desvios da normal climatológica, determinam a intensidade de uma seca e a extensão dos seus efeitos a nível das reservas hidrológicas, das atividades económicas em geral (incluindo a agricultura), do ambiente e dos ecossistemas.

Os impactes socioeconómicos e ambientais da seca estão associados ao efeito conjunto dos impactes naturais e sociais que resultam da falta de água, devido ao desequilíbrio entre a procura e a oferta dos recursos de água. A seca socioeconómica ocorre quando o decréscimo de disponibilidade de água é de tal ordem acentuado que tem consequências negativas nas pessoas e nas atividades económicas, ou seja, na sociedade em geral.

Em Portugal, a monitorização da seca meteorológica é realizada através do Índice Palmer ou PDSI (Palmer Drought Severity Index) e do Índice SPI (Standardized Precipitation Index).

O PDSI baseia-se no conceito do balanço da água, tendo em conta dados de quantidade de precipitação, temperatura do ar e capacidade de água disponível. A aplicação deste índice permite detetar a ocorrência de períodos de seca e classifica-os em termos de intensidade (fraca, moderada, severa e extrema).

O SPI quantifica o défice ou o excesso de precipitação em diferentes escalas temporais, que refletem o impacte da seca nas disponibilidades de água. As menores escalas, até 6 meses, remetem à seca meteorológica e agrícola (défice de precipitação e de humidade no solo, respetivamente) e, entre 9 e 12 meses, à seca hidrológica, com escassez de água refletida no escoamento superficial e nas albufeiras.

 

PDSI

Classes de seca

SPI

4.00 ou superior

chuva extrema

2.00 ou superior

3.00 a 3.99

chuva severa

1.50 a 1.99

2.00 a 2.99

chuva moderada

1.00 a 1.49

0.50 a 1.99

chuva fraca

0.99 a 0.50

0.49 a -0.49

normal

0.49 a -0.49

- 0.50 a -1.99

seca fraca

- 0.50 a -0.99

- 2.00 a -2.99

seca moderada

- 1.00 a -1.49

- 3.00 a -3.99

seca severa

- 1.50 a -1.99

- 4.00 ou inferior

seca extrema

- 2.00 ou inferior

 

 

Os níveis de alerta para a seca agrometeorológica correspondem às seguintes descrições dos índices PDSI e SPI:

  • Nível A.1 – “Pré-Alerta”: PDSI 2 meses consecutivos em seca moderada e SPI em seca fraca a moderada;
  • Nível A.2 – “Alerta”: PDSI 2 meses consecutivos em seca severa e SPI em seca moderada a severa;
  • Nível A.3 – “Emergência”: PDSI em seca extrema e SPI em seca severa a extrema.

A seca hidrológica é avaliada através da monitorização das massas de água. A evolução mensal dos níveis de armazenamento das albufeiras, da precipitação e do escoamento e a sua comparação com as séries históricas permite aferir se existe seca hidrológica. Esta monitorização constitui o primeiro elemento de medida do controlo das disponibilidades hídricas existentes, servindo para avaliar a eficácia das medidas de planeamento e da eficiência das medidas de gestão, e constituindo, também, um meio de disponibilização direta às entidades interessadas da informação recolhida.

Os níveis de seca hidrológica propostos nos Planos de Prevenção e Mitigação dos Efeitos da Seca, atendendo às alterações que se têm verificado, foram objeto de atualização para cada bacia hidrográfica monitorizada, tendo por base um conjunto de índices, registos históricos de secas e dos seus impactes nos diversos setores, com particular incidência, nos últimos 20 anos, nas secas de 2004/05, 2011/12 e 2016/17.

A análise dos períodos de seca hidrológica por bacia hidrográfica assenta em dois indicadores:

  • Drought State Index for Reservoirs (DSIR) – indicador que avalia o volume de água disponível nas albufeiras; comparação do volume armazenado atual mensal, por bacia hidrográfica, com estatísticas da série histórica total;
  • Percentis – comparação do volume atual mensal, por bacia hidrográfica, com os percentis da série histórica total.

A informação estatística foi correlacionada com os impactes das secas nas últimas duas décadas, o que conduziu às classes de seca hidrológica constantes da seguinte tabela.

 

Classes de seca hidrológica

Nível de seca hidrológica

Percentis (P)

Potenciais Impactes

Húmido

P > 75

Situação em que os recursos hídricos se encontram significativamente acima dos valores médios.

Normal

P50 < P ≤ P75

Situação normal correspondente a um ano médio.

Seca fraca

P25 < P ≤ P50

Possível início de seca – Seca de curto prazo com possível impacte no cultivo e no crescimento de culturas ou pastagens.

Possível fim da seca: Pastagens ou culturas não totalmente recuperadas, mas ainda com défice de água.

Seca moderada

P10 < P ≤ P P25

Alguns impactes nas culturas, pastagens, diminuição dos caudais nos rios, nos volumes armazenado nas albufeiras, diminuição das reservas subterrâneas. Seca em desenvolvimento.

Seca severa

P5 < P ≤ P10

Perdas em culturas ou pastagens.

Escassez de água.

Restrições aos usos.

Seca extrema

P ≤ P5

Grandes perdas em culturas/pastagens.

Escassez ou restrições generalizadas de água.

 

 

A metodologia descrita é aplicada a cada mês do ano, permitindo, desta forma, definir níveis de alerta mensais. Assim, é possível monitorizar o estado das reservas hídricas superficiais, por bacia hidrográfica, antecipar possíveis situações de seca e implementar medidas de prevenção de seca.

As disponibilidades hídricas subterrâneas desempenham um papel particularmente importante nos períodos de seca, devido à capacidade de regularização interanual dos sistemas aquíferos, tornando-os resilientes, uma vez que continuam a suprir necessidades de água de vários setores de atividade. Contudo, caso a diminuta precipitação se prolongue, as reservas subterrâneas diminuem, uma vez que não há reposição da água subterrânea através da recarga.

Em função das disponibilidades hídricas subterrâneas, monitorizadas em quatro momentos de cada ano hidrológico - outubro, janeiro, abril e julho -, é averiguada a pertinência de se adotarem medidas em termos de gestão de águas subterrâneas. Assim, atendendo às disponibilidades hídricas nos quatro momentos referidos, identificam-se as massas de água em situação crítica e as massas de água em situação de vigilância. As situações críticas dizem respeito a massas de água onde persistem, ao longo do ano hidrológico em causa, níveis inferiores ao percentil 20, pelo que urge a aplicação de medidas preconizadas no âmbito da seca. As situações sob vigilância referem-se a massas de água onde se observam descidas significativas do nível de água subterrânea, pelo que merecem, também, especial atenção.

Informação complementar sobre as disponibilidades hídricas superficiais e subterrâneas pode ser consultada na ficha temática “Disponibilidades de águas superficiais e subterrâneas”.

A duração e a intensidade de um evento de precipitação permitem-nos caracterizar a magnitude de uma cheia, enquanto a avaliação dos seus impactos permite-nos avaliar a severidade das suas consequências.

Os impactos são medidos por indicadores por recetor: população, ambiente, património cultural e atividades económicas, e diferenciados em classes, que podem ser valoradas, desde uma afetação muito baixa a muito elevada.

 

Conceitos

«Cheias», fenómeno hidrológico extremo causado por precipitação de duração mais ou menos prolongada numa bacia hidrográfica ou em parte dela, originando caudais que excedem a capacidade de vazão do leito menor do rio. Podem ser de origem natural ou causadas por ações humanas. As cheias são um evento de longo prazo (ao contrário das inundações repentinas), podendo durar dias ou semanas. [Fonte: Adaptado de Vaz & Hipólito, 2017, e National Weather Service (NOOA)]

«Seca», redução temporária da disponibilidade de água, devida a precipitação insuficiente, com repercussões negativas nos ecossistemas e nas atividades socioeconómicas. De uma maneira geral, é entendida como uma condição física transitória, associada a períodos mais ou menos longos de reduzida precipitação. [Fonte: Plano Seca, 2017]

«Seca meteorológica», a seca associada à não ocorrência de precipitação, definida como a medida do desvio da precipitação em relação ao valor médio da normal climatológica e caracterizada pela falta de água induzida pelo desequilíbrio entre a precipitação e a evaporação, a qual depende de outros elementos como a velocidade do vento, temperatura, humidade do ar e insolação. Deve ser considerada como dependente da região, uma vez que as condições atmosféricas que resultam em deficiências de precipitação podem ser muito diferentes de região para região. [Fonte: Plano Seca, 2017]

«Seca agrícola», a seca associada à falta de água causada pelo desequilíbrio entre a água disponível no solo, a necessidade das culturas e a transpiração das plantas. Este tipo de seca está relacionado com as caraterísticas das culturas, da vegetação natural, ou seja, dos sistemas agrícolas em geral. [Fonte: Plano Seca, 2017]

«Seca agrometeorológica», conjugação dos conceitos de seca meteorológica e de seca agrícola, uma vez que existe uma relação de causa-efeito entre elas. Desta forma, a falta de água induzida pelo desequilíbrio entre a precipitação e a evaporação irá ter consequências diretas na disponibilidade de água no solo e, consequentemente, na produtividade das culturas. [Fonte: Plano Seca, 2017]

«Seca hidrológica», a seca associada ao estado de armazenamento das albufeiras, lagoas, aquíferos e linhas de água em geral. A seca hidrológica está, assim, relacionada com a redução dos níveis médios de águas superficiais e subterrâneas e com a depleção de água no solo. Este tipo de seca está normalmente desfasado da seca meteorológica, dado que é necessário um período de tempo maior para que as deficiências na precipitação se manifestem nos diversos componentes do sistema hidrológico. [Fonte: Plano Seca, 2017]

É importante distinguir o conceito de seca do conceito de escassez de água.

«Escassez de água», a carência de recursos hídricos disponíveis face ao que seriam os suficientes para atender às necessidades de uso da água numa região. A escassez pode resultar de mecanismos físicos ou económicos. A escassez física é resultado da inexistência de recursos hídricos naturais suficientes para satisfazer a procura de uma região; por seu lado, a escassez económica resulta numa ineficiente gestão dos recursos hídricos disponíveis (por exemplo, existência de elevados valores de perdas nas redes de distribuição, seja no regadio ou no abastecimento público). [Fonte: Adaptado de Plano Seca, 2017]

 

Contribuição para os ODS

 

Objetivos: 
  • Avaliar a ocorrência de períodos de redução da disponibilidade de água, considerando diferentes definições de seca: meteorológica, agrometeorológica e hidrológica;
  • Garantir a informação do Sistema de Previsão e Gestão da Seca que permita, com a colaboração das entidades envolvidas, fazer atempadamente face aos potenciais impactes da seca, através da implementação das medidas afetas a cada nível de alerta;
  • Avaliar a ocorrência de precipitações intensas que geram cheias e caracterizar os seus impactos;
  • Garantir o funcionamento do Sistema de Vigilância e Alerta de Recursos Hídricos, para uma gestão dos eventos de cheias e para suporte à tomada de decisão pelos agentes de proteção civil.
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Principais instrumentos de política

Análise da evolução:

Seca meteorológica e agrometeorológica

Última atualização: 
Sexta, 28 Novembro, 2025